segunda-feira, 8 de junho de 2009

Carta ao Filho

Porque cresceste?

As lembranças de outros tempos, mais simples, com amor mais fácil, com olhares mais ternos e proximidade maior não bastavam para que tua vida se completasse?

Não... precisaste crescer, como o fizeram todos os adultos de hoje, crianças de ontem, para conhecer o mundo, a vida a ser vivida e os desencontros que ela proporcionaria.

Saudade de embalar-te para que o sono chegasse mais tranquilo, sem sustos ou medos do negrume da noite que insistia em trazer sombras de assombrações para ti.

Sofres por tuas escolhas e isso me faz, junto a ti, sofrer também, por não entender o que sentes, o que ficou em tua alma doída, roída por sentimentos de conflito, impotências perante escolhas e caminhos deixados para trás, mas que insistem em continuar te acompanhando, fazendo doer e machucar ainda mais, passo após passo, como se espinhos te ferissem os pés.

Porque tiveste que crescer quando a vida, em tua tenra idade era mais simples? O tempo, este implacável juiz e mestre não poderia ter parado para ti pelo menos um pouco para que eu tivesse tempo de ensinar-te um pouco mais do que te esperava pela frente? Não. Ele não podia e não o faria ainda que pudesse, pois é o seguir do tempo que hoje embala tua vida, teu sono, teus sentimentos, cobrando-te respostas quando ainda nem sabes o que perguntar. É o tempo que te cobra maturidade que, ainda que insista em ter, te dói na alma, na saudade da meninice, da proteção que tinhas quando um joelho ralado era um grande problema.

Crescer tem seu preço. Dói mas te impulsiona a novos mundos e tempos diferentes daquele que conheceste. Cobra ainda o preço daqueles que te amam, que agora, ao verem-te crescido, sofrem de preocupações, medos de ver-te perdido em caminhos que não aqueles que ousaram traçar para tua vida, como se fossem donos de ti. Entenda que não o fazem por mal, mas sim para aplacar a saudade de suas almas que agora observam teu vôo sem poder bater asas atrás de ti, seguindo o ciclo da vida, do tempo ou ainda carregá-lo no colo ou de cavalinho pois cresceste demais.

Já sentiste em tua alma a dor do medo da perda? Creio que não pois isso só sentirás quando estiveres deste lado, escrevendo para teu filho que cresceu e que te faz sentir o medo da solidão, da perda, do desencontro e de ver-te sofrendo. O amor é engraçado pois faz com que desejemos sofrer por quem amamos, para poupá-lo das dores do sofrimento, ainda que saibamos que cada um, em seu tempo e momento, precisará sofrer, sentir para aprender a viver ainda mais.

Caminhas por aí, solitário, com as dores a te acompanhar, lágrimas de dores sentidas, sofridas pelo coração, sem entender o porquê. Talvez a resposta venha no tempo, o mesmo que insiste em girar e cobrar o crescimento. Talvez não venha e te deixe com a dúvida. Por ora, meu filho, busque a vida e não as respostas para o passado pois és dono de ti mesmo e de tua alma, escolhendo se queres sofrer, fazer doer ou deixar cicatrizar o ferimento aberto que insiste em incomodar-te e fazendo isso, incomoda quem o ama, pela impotência de nada poder fazer, pois crescer, implica em tomar decisões que nem sempre são as mais acertadas, mas que para o momento trarão novos saberes, experiências e rumos para tua vida.

Como o navio, num mar escuro, tem o farol para conduzi-lo ao porto seguro, é o filho que singra mares nunca dantes navegados, mas com a certeza do porto seguro de quem o ama, para ampará-lo e trazê-lo de volta à terra firme do coração conhecido.



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